terça-feira, fevereiro 07, 2006

O Céu em Berlim

Numa cidade dividida, centro de uma História que não se esquece, como se vive, e como se vive com o seu cinema? O retrato de Asas do Desejo, de Wim Wenders, é o único possível - na rejeição do que é físico, da violência dos corpos, do confronto que existe entre cada transeunte que passa na rua, procura-se a verdade de cada um, sempre escondida, através de seres puros, que planam em espírito e que têm ouvidos para todos, anjos doces e serenos, trocando histórias também eles, de contos pequenos e anedotas, notas engraçadas de ocorrências da vida.
Num país traumatizado, numa cidade de habitantes perdidos, cada um no recanto do seu pensamento, colocam-se todas as questões depois da catástrofe - por que estamos aqui, o que andamos a fazer, e como lidamos com isso? Antes ainda de saber viver o presente, como lidar com o passado, o cinema que não se pode abandonar? São histórias eternas, poemas e angústias que sobrevoam o filme, ultrapassam-se como diálogos com o espectador e a sua condição mais íntima, o peso que esta comporta, e que anjos desejam também viver.
A única visão apresentável é a que se vê - do céu, do mais puro e espiritual, uma nova ordem de vivência, que marca a tal distância, que nos consegue afinal todos unir num tempo sem tempo, numa paz sem conflito, sem guerra, lidando suavemente com o que passou e com o que ainda não caíu ("schön", belo, assim se mostra o Muro que quebra a cidade).
Assim, como regressar por fim à vida, saber que estamos sozinhos, mas lidar com a nossa condição, saber gerir o que era vazio e agora vida, o que era triste e agora bonito, tanto para cada um, como para um país inteiro? Dois seres separados, agora unidos, ambos solitários, por fim crescendo e unidos, num abraço de conforto, num beijo de paixão - como um "ex-anjo", e uma (sempre) bailarina ou trapezista, que nunca cai, e quer voar para mais, sempre mais alto, sempre em paz. Como o final deste filme, e de tantos outros, também citados pelo seu autor (Yasujiro, François, Andrej... cineastas da vida) - pelo amor. Assim seremos sempre quem somos, na resolução do que mais vivo existe em nós, através do cinema, dos nossos mistérios, para o mais concreto, as nossas necessidades, o que nos faz viver ainda no dia-a-dia.
Tudo isto e muito mais é o céu em Berlim. Outros anjos ficaram e não caíram, mas um dia hão de descer, puxando-nos para a vida e mexendo com o nosso cinema. Do céu, para a terra, com paz e amor.

1 comentário:

Cris Thaís Quinteiro disse...

olá! ENTREI EM SEu blog por acaso..na busca por imagens do filme " antes do amanhecer" para postar no meu blog.

amo esse filme. dos meus favoritos!
um abraço