
Dizer qual é o melhor western de sempre é o mesmo que perguntar a várias pessoas qual é a sua cor preferida. Cada um tem os seus tons, e cada um lhes faz lembrar qualquer coisa, da mais banal à mais complexa. Há westerns-comédias, ou quase (os enredos sempre magníficos de Hawks), westerns de luta e de passado (de cada personagem de Ford), westerns-drama (High Noon e o seu tempo real), ou westerns apaixonados, como Johnny Guitar de Nicholas Ray. Esquecendo a cor preferida, este cinéfilo tenderia para escolher, provavelmente, The Searchers do mestre John Ford como o seu, obra-prima absoluta do cinema.
Percebe-se a razão pela qual o western sempre foi um género de eleição e de perfeição no cinema - nele cabe tudo, dele e das suas paisagens parte-se para tudo. No entanto, existe ainda outro. Pode-se não discutir qual deles todos será o melhor, mas será apenas justo considerar um desses mesmos como a quintessência do western - e esse filme chama-se Shane.
A obra de George Stevens possui tudo o que se pede ao género, das melhores maneiras: simplicidade, emoção, rivalidades, paixão. E, já agora, bons movimentos de câmara. Os seus actores eram quase todos desconhecidos do grande público, excepto Jean Arthur, actriz-símbolo de Frank Capra, aparecendo aqui no seu último papel. Alan Ladd, o seu actor principal, foi estrela de série-B da época noir, tendo após este filme surgido como novo herói western-B. O seu cenário é simples, mas estrondoso - são muito poucos os espaços pequenos que permitam fechar toda a história. As suas próprias lutas, tecnicamente preciosas, quando fechadas entre paredes, tendem a explodir para fora. Shane é, também ele, a quintessência do bom-cowboy - fala pouco (só quando deve), só precisa de uma arma, esconde um passado (que nunca revela) à procura de estabilidade e de acolhimento, apaixona-se por uma mulher bonita que o ama, mas sacrifica-se pela família dela e pelo seu isolamento. Assim parte, de novo, rumo à paisagem, sozinho, como tinha feito à chegada. Jack Pallance, a fazer de vilão, de chapéu preto, de luva preta, e com um rosto inconfundível, é, arrisco-me a dizer, o mais perfeito fora-da-lei. Fala com as duas pistolas, e mata com o olhar.
O que está em causa em Shane é, portanto, tudo o que se colocou no género, e não só - a eterna luta, a comunidade, a amizade, o amor, a morte, e o passado. Sempre, o passado, como que relembrado por cada um dos momentos do essencial tema musical. Assim se vive no western, género solitário, mas género por essência, e por inspiração. Caminhando solitariamente no (seu) cinema, espelho da vida.